REVOLTA E RETORNO
Parte I
- Detesto quando me vejo presa e só numa dispensa.
- Prometi a mim mesma que, caso o telefone não tocasse até domingo, estourado estaria o prazo de validade desta minha expectativa com relação aos homens.
- Malvados seres duros e pouco duráveis são eles, que nos deixam esperando sobre prateleiras desertas.
- Por isso, não me sinto culpada quando lanço ao lixo tal material orgânico podre e mal intencionado.
- Trucidados sejam os exemplares de embalagens vazias pela máquina processadora de detritos retornáveis!
- Seria mesmo bom, se um dia eles pudessem retornar com a moral reciclada. Mas, não os deixo em latões fora de casa, com a esperança de ainda revê-los.
- Quando limpo a geladeira em que estou trancada, só persigo a sensação de alívio e segurança da companhia perecível da minha consciência!
Parte II
Eis, então, retornado das profundezas do aterro mais próximo, o homem plástico.
Embora suas formas perfeitas tomem conta do olhar de quem pretende consumi-lo, ele muito se orgulha do próprio conteúdo.
- Não admito ser tratado como um utensílio sem alma.
- Como quer aquela desgraçada ser compreendida se, para isso, seria necessário que ela deixasse de jogar fora tantas formas de sentir já dispensadas?
- Almas e mentes não se descartam.
- Elas tampouco se renovam ao passar por uma máquina construída por mulheres, que remontam seus brinquedos vivos e eretos, de acordo com sua vontade de consumista compulsiva.
- Eu não quero ficar só, nem aceito que, para ter companhia, deva ser recriado.
- Sou pré-dado como produto, adulterado e adúltero, quando meu único erro é querer tudo.
Parte III
- Mamãe, posso levar o cereal que tem o elefantinho marrom na caixa?
- Mas, que droga! Você não pára de encher o carrinho...
- Essa foi a última vez que lhe trouxe ao mercado. Ouviu?
Parte IV
- Dá um trocado pra eu comprar algo de comer, senhora?
-Poxa...ninguém mais ajuda o próximo hoje em dia.
A falta de alimentação não lhe deixava perceber que o problema era justamente o fato de ele estar próximo demais.
Prometesse levar sua miséria para longe e, quem sabe, alguém o atenderia?
Parte V
- Devolve meu sorvete, imbecil!
- Vem pegar se é assim valente...
Valentia não se acha em promoção de cargo,
nem tem o preço abaixado com o excesso de sua oferta.
Vencer a própria data de validade é o tipo de coisa que não traz código de barras.
Mas, são tantos os códigos de barrar as qualidades dos seres nesta nossa economia de idéias,
que alguns corações já se açucararam, enquanto outros se tornaram gelos.
Ambos passaram do prazo de uso e esqueceram para que foram feitos.
Entre marcas de tensão na face e rótulos de ocultar o produto já passado,
os seres são marcados pelo mercado e, assim, sempre estão mercadorias.
Fui deixado com outros numa caixa onde por fora se lê: "Cuidado Frágil".
O alerta é auto-explicativo para que o mundo do consumo saiba o que deve ser isolado.
Parte I
- Detesto quando me vejo presa e só numa dispensa.
- Prometi a mim mesma que, caso o telefone não tocasse até domingo, estourado estaria o prazo de validade desta minha expectativa com relação aos homens.
- Malvados seres duros e pouco duráveis são eles, que nos deixam esperando sobre prateleiras desertas.
- Por isso, não me sinto culpada quando lanço ao lixo tal material orgânico podre e mal intencionado.
- Trucidados sejam os exemplares de embalagens vazias pela máquina processadora de detritos retornáveis!
- Seria mesmo bom, se um dia eles pudessem retornar com a moral reciclada. Mas, não os deixo em latões fora de casa, com a esperança de ainda revê-los.
- Quando limpo a geladeira em que estou trancada, só persigo a sensação de alívio e segurança da companhia perecível da minha consciência!
Parte II
Eis, então, retornado das profundezas do aterro mais próximo, o homem plástico.
Embora suas formas perfeitas tomem conta do olhar de quem pretende consumi-lo, ele muito se orgulha do próprio conteúdo.
- Não admito ser tratado como um utensílio sem alma.
- Como quer aquela desgraçada ser compreendida se, para isso, seria necessário que ela deixasse de jogar fora tantas formas de sentir já dispensadas?
- Almas e mentes não se descartam.
- Elas tampouco se renovam ao passar por uma máquina construída por mulheres, que remontam seus brinquedos vivos e eretos, de acordo com sua vontade de consumista compulsiva.
- Eu não quero ficar só, nem aceito que, para ter companhia, deva ser recriado.
- Sou pré-dado como produto, adulterado e adúltero, quando meu único erro é querer tudo.
Parte III
- Mamãe, posso levar o cereal que tem o elefantinho marrom na caixa?
- Mas, que droga! Você não pára de encher o carrinho...
- Essa foi a última vez que lhe trouxe ao mercado. Ouviu?
Parte IV
- Dá um trocado pra eu comprar algo de comer, senhora?
-Poxa...ninguém mais ajuda o próximo hoje em dia.
A falta de alimentação não lhe deixava perceber que o problema era justamente o fato de ele estar próximo demais.
Prometesse levar sua miséria para longe e, quem sabe, alguém o atenderia?
Parte V
- Devolve meu sorvete, imbecil!
- Vem pegar se é assim valente...
Valentia não se acha em promoção de cargo,
nem tem o preço abaixado com o excesso de sua oferta.
Vencer a própria data de validade é o tipo de coisa que não traz código de barras.
Mas, são tantos os códigos de barrar as qualidades dos seres nesta nossa economia de idéias,
que alguns corações já se açucararam, enquanto outros se tornaram gelos.
Ambos passaram do prazo de uso e esqueceram para que foram feitos.
Entre marcas de tensão na face e rótulos de ocultar o produto já passado,
os seres são marcados pelo mercado e, assim, sempre estão mercadorias.
Fui deixado com outros numa caixa onde por fora se lê: "Cuidado Frágil".
O alerta é auto-explicativo para que o mundo do consumo saiba o que deve ser isolado.