PIADA
Joãozinho decidiu escrever qualquer coisa que não tivesse relação com a aula enquanto o professor falava.
Antes achava que só conseguiria soltar sua voz interna quando fora tudo fosse silêncio,
mas a mente é o próprio universo em dimensões e, com todo o seu exagero que ultrapassa o real, também é capaz de caber na mínima fresta imposta pela sorte.
O menino, então, adaptou sua imaginação à falta de ter com que se adaptar. E viu que não precisava de tempo livre, nem inspiração planejada e repensada com critérios metodologicamente implantados pela diretora.
Num papelzinho, desenhou uma criança de ponta cabeça.
Traçou, no vazio, o esboço de um espaço fora da linha que, aos poucos, adquiriu o contorno de dedos.
Focou atenção na ausência, no que estava livre de qualquer sugestão de forma.
Fez primeiro um pé, voltado para o céu, pisando nuvens.
Depois, veio o corpo deformado e caricatural.
O tronco saiu arrotado, nada arrojado, como as coisas que se expressam sem querer.
Enfim, surgiu a cabeça, grande e iluminada pelo vazio de cores, preenchido por todos os espectros de luz contidos no branco da folha.
Era, sem dúvida o desenho mais estranho que alguém já tinha visto.
E Joãozinho teve orgulho da sua apresentação infantil no espaço.
Pela primeira vez, ele sentia um estranho alívio por ter produzido o inesperado.
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